quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Sorvete ou a vida dela?

Porque eu produzo tanto texto contra o transativismo? Porque o transativismo pra mim soa como se estivessem me fazendo a pergunta título: Sorvete ou a vida dela? É pra mim exatamente como se me perguntassem se eu prefiro um sorvete gostoso ou salvar a vida de uma pessoa. O sorvete é uma delícia, mas a escolha pra mim é tão óbvia que eu não sei descrever de outra forma.

Antes vou contextualizar aqui como é possível que eu esteja dizendo que a dor trans é algo fútil como "sorvete" em comparação com a vida das mulheres. Não vou diminuir a dor da vivência trans visto que o conhecimento do feminismo radical me trouxe angústia de morte, literalmente, não me matei por pouco depois de descobrir que eu "não era o que eu era". Essa dor passou mas uma completa falta de propósito e sentido na vida permaneceu, até hoje, foi como "desexistir".

"Nossa Julia como você pode então comparar essa sua vivência com um simples agrado?" É porque essa comparação seria a comparação que o transativismo gostaria que fosse feita, como se a escolha trans fosse entre a vida delas e a vida das mulheres e não é essa a verdade. Quem trás essa dor e essa morte às mulheres trans é o patriarcado e de modo mais individual os homens "padrão", não é o conhecimento da realidade das castas sexuais. Culpar as mulheres e tentar coloca-las subservientes pela empatia induzindo as pessoas a pensar que as trans precisam escolher entre a vida delas e a das mulheres é uma chantagem típica do patriarcado.

Então o que eu chamo de "sorvete" não é a possibilidade de me livrar de todo o preconceito e ter minha existência "tal como é" reconhecida e respeitada, não é isso que o transativismo oferece. O transativismo oferece um agradinho gostoso, um ambiente alienante, fascista, venenoso e que coloca nosso ego nas alturas. Então sim, o que o transativismo oferece é um "sorvete", não é libertação, não é nada material que mude a vida de pessoas trans, é uma bajulação psicopata-nacísica.

O preço dessa bajulação é a vida de milhares de mulheres (ou se o transativismo for bem sucedido milhões). Eu não gosto de diminuir as coisas, o transativismo custa, senão a vida das mulheres, sua sanidade e existência enquanto sujeito. E isso não é exagerar as coisas. Basta conversar com as meninas que apoiam o transativismo, muitas já não são mais críticas, foram reprogramadas para repetir frases prontas, como robôs, e lutar até a morte para defender seus transopressores. Odeiam profundamente mulheres que defendem mulheres, ou seja, as únicas pessoas que poderiam resgatá-las do seu sequestro emocional.

Se eu tenho que escolher entre o "sorvete" do transativismo e entre a segurança de mulheres em seus ambientes exclusivos, como eu posso sequer cogitar escolher o "sorvete"? Como eu posso dizer que sujeitar uma criança à possibilidade de ser violentada sexualmente no banheiro feminino é algo aceitável? Como eu posso cogitar a ideia de enviar criminosos que já estupraram mulheres para a cadeia feminina porque eles agora "se sentem mulher"? Como eu posso deixar que mulheres em situação de trauma precisem conviver com pessoas portadoras do órgão que as violou porque um dos seus violadores agora "é uma das garotas como qualquer outra"? Como posso deixar agressores se tornarem vítimas?

A verdade é que mesmo que a pergunta fosse: Minha vida ou vida das mulheres? Não tem uma resposta heroica aqui, esse pergunta seria uma falácia, isso é só propaganda do transativismo. Se eu confronto quem é verdadeiramente meu inimigo, o "homem padrão", nunca terei que escolher entre a minha vida e a vida das mulheres. Abolir gênero é o que salva as pessoas trans, enfrentar mulheres e coloca-las em risco é apenas servir, com fidelidade extrema, ao patriarcado.

2 comentários:

  1. Júlia, muito obrigada por todos os textos que você tem publicado. Tenho aprendido demais com todos eles. ❤️

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